A Universidade Federal de Viçosa (UFV) se torna a primeira instituição pública do país a abrigar um banco genético dedicado à Cannabis Sativa L., planta com grande potencial de uso em diversas áreas, como produção de medicamentos, fibras, bioplástico, alimentos não psicoativos e biocombustíveis.
A criação do Banco de Germoplasma é vista como um marco inicial para o Brasil explorar essa planta como uma futura commodity agrícola. A iniciativa visa catalogar e estudar a variabilidade genética das diferentes variedades de Cannabis, abrindo caminho para melhoramentos que possam atender a diversas demandas do mercado.
Iniciativa viabilizada com habeas corpus
Devido às propriedades psicoativas da planta, o projeto enfrentou desafios legais até ser aprovado. Após quatro anos de negociações, a construção do Banco de Germoplasma foi autorizada por meio de um habeas corpus concedido pela Subseção Judiciária da Justiça Federal de Viçosa, sob a jurisdição do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6).
O banco será construído em uma área de quase um hectare no Vale da Agronomia, com segurança reforçada e monitoramento constante.
A frente do projeto está o professor Derly José Henriques da Silva, do Departamento de Agronomia da UFV, que possui mais de 20 anos de experiência na coordenação do Banco de Germoplasma de Hortaliças da instituição.
Segundo ele, o crescente interesse do mercado pela Cannabis motivou a UFV a firmar, em 2023, uma parceria com a empresa Cannabreed Technology Brasil Ltda. para estudar a planta em condições de campo e estufa, especialmente em relação à sua adaptação ao clima tropical.
Desafios regulatórios
Apesar de seu potencial agrícola, a Cannabis enfrenta desafios regulatórios no Brasil. Embora o cultivo deva ser supervisionado pelo Ministério da Agricultura, a planta, por ser psicoativa, também é regulada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que ainda não aprovou sua regulamentação.
Base para pesquisas futuras
Segundo o professor Derly, a criação do banco genético foi possível graças ao argumento de que o projeto visa justamente fornecer a base para futuras pesquisas sobre a planta.
Com a autorização judicial, a construção do Banco de Germoplasma começou nesta segunda-feira (21) e será financiada pela empresa parceira.
Cannabis:ouro verde
Além do uso medicinal dos canabinoides (moléculas medicinais da Cannabis), a planta é multiusos e nos Estados Unidos já se fala em 50 mil aplicabilidades na indústria.
Um dos biotipos da Cannabis é o cânhamo, por exemplo, cepa rica em fibra útil para indústria têxtil e construção. Suas sementes, consideradas super alimentos, são ricas em proteínas e óleos graxos, que têm grande potencial na indústria alimentícia e cosmética.
Para completar, o professor Derly explica ainda que as raízes profundas desse vegetal ajudam a proteger o solo, sendo ideal para cultivo em áreas degradadas, enquanto a biomassa produzida auxilia no sequestro de CO2, um mercado que está em fase de regulamentação no Brasil
A UFV pretende utilizar o banco genético para estudar a adaptação das variedades de Cannabis ao clima brasileiro e promover uma produção sustentável e segura da planta.
Banco de Germoplasma: preservação e pesquisa
O objetivo do Banco de Germoplasma da UFV é reunir até 5 mil tipos de sementes de Cannabis, provenientes de várias regiões do Brasil e do mundo. A coleção poderá futuramente ser ampliada para incluir cultura de tecidos e outros materiais genéticos. Uma vez catalogadas e estudadas, as informações sobre as variedades estarão disponíveis para a comunidade científica e empresas parceiras.
A conclusão das obras está prevista para o início de 2025, quando o banco poderá começar a receber e cultivar as sementes. Para o professor Derly, a iniciativa marca um importante passo para o Brasil explorar o potencial econômico e medicinal da Cannabis de maneira transparente e científica.
“Essa é uma oportunidade de fazer da Cannabis um negócio promissor para o Brasil”, afirma o professor, que também será o curador do Banco de Germoplasma.