Depois de receber organizações e entidades contrárias à PEC 45/2023 (que criminaliza o usuário de drogas), Rodrigo Pacheco se comprometeu em aprofundar a discussão por meio de sessão de debate com especialistas

O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, recebeu organizações, entidades e membros da sociedade civil contrários à PEC 45/2023 – que altera a constituição para criminalizar o porte e uso de drogas no Brasil, nesta quarta-feira, 3 de abril.

No encontro, os representantes das organizações apresentaram ao presidente Pacheco e aos senadores Jaques Wagner (PT/RJ) e Marcelo Castro (MDB/PI) uma nota pública contrária à continuidade da PEC 45/2023.

O documento contém mais de 350 assinaturas de ativistas e membros de movimentos sociais e de redes nacionais e internacionais como o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a Coalizão Negra por Direitos, a Federação das Associações de Cannabis Terapêutica (Fact), e a Anistia Internacional.

Na nota de repúdio, todos expressam preocupação com a condução dos debates sobre as pautas de Políticas de Drogas e Direitos Humanos no Brasil.

Compromisso em debater o assunto

Como resposta, o presidente do Senado se comprometeu a realizar uma sessão de debates com a participação de especialistas da ciência, saúde e outras áreas correlatas para esclarecer dúvidas, desmistificar preconceitos com base na ciência e derrubar informações falsas que confundem a população.

Para Nathália Oliveira, socióloga, cofundadora da Iniciativa Negra e coordenadora da Comissão de Legislação, Normas e Articulação Interinstitucional do Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas (Conad) foi muito importante a escuta ativa por parte do presidente da casa, que é um dos autores da PEC, diante de um assunto que irá afetar diretamente a população, com a alteração da Constituição brasileira.

Discussão contaminada por fakenews

Créditos Foto: Pedro Gontijo / Presidência Senado

Créditos Foto: Pedro Gontijo / Presidência Senado

“Se a PEC 45 passar com argumentos rasos como os que estão postos e sem considerar a opinião pública e a sociedade civil, teremos um retrocesso sem precedentes”, afirma Oliveira.

Já Luana Malheiro, antropóloga e pesquisadora integrante da Secretaria Executiva da Rede Plataforma Brasileira de Política de Drogas, destaca que a queda de braço entre Senado e Supremo Tribunal Federal (STF) não ajuda a pauta.

Disputa entre os poderes não ajuda

“Uma guerra de poderes foi colocada à mesa, com o entendimento de que a discussão não pode ser tratada unicamente pelo Supremo, sugerindo que as casas legislativas também precisam entrar no debate, o que é legítimo. No entanto, percebemos a ausência de conhecimento técnico sobre a rede de serviços de saúde e atenção psicossocial a usuários que fazem uso abusivo de drogas no país. E é nesse ponto que precisamos reforçar a importância da política de redução de danos e das medidas de acolhimento ao usuário, como alternativas ao punitivismo”, defende Luana.

Em ano de eleições municipais, as discussões sobre possíveis mudanças na atual política de drogas têm esquentado o debate no Congresso Nacional e evidenciado uma disputa entre os poderes da República.

Congresso contra ataca

Desde que a Suprema Corte retomou o julgamento que pode descriminalizar o porte de maconha para consumo – indicando a inconstitucionalidade de partes da Lei de Drogas – o Congresso se mobiliza num contra ataque.

Dos 11 ministros que compõe a corte, cinco votaram a favor e três contra. Por meio de um pedido de vista, o ministro do STF, Dias Toffoli, paralisou mais uma vez a ação para analisar o processo em julgamento há quase 12 anos.

Como uma resposta imediata, deputados e senadores – ditos conservadores – se movimentaram para frear a atuação da Suprema Corte, que foi provocada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo a interprestar como inconstitucional o artigo 28 da Lei de Drogas – que criminaliza o usuário.

 

Drogas, quanto custa proibir?

O projeto ‘Drogas: Quanto Custa Proibir’, coordenado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, revela os impactos orçamentários para implementar a política de combate às substâncias ilícitas no Brasil.

De acordo com o levantamento, em apenas um ano os estados do Rio de Janeiro e de São Paulo gastaram R$5.2 bilhões com Polícia Militar, Polícia Civil, Sistema Judiciário, Defensoria Pública, Ministério Público, Sistema Penitenciário e Sistema Socioeducativo para implementar a Lei de Drogas.

Outros números

 Em 2019, a polícia brasileira matou mais de 6.300 pessoas, segundo o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania. Entre os mortos, 79% eram negros.

Atualmente, 32% dos crimes cometidos estão relacionados à Lei de Drogas. A mudança legislativa promoveu uma explosão no número de prisões. Entre 2000 e 2020, a população carcerária cresceu 226%.

Para Julita Lemgruber, que está à frente projeto, é importante que a sociedade civil organizada conheça esse tipo de cifra para poder opinar onde quer que o dinheiro público seja investido.

“Se agente pudesse escolher, talvez a gente escolhesse que esse 5.2 bilhões fossem para construção de escolas e hospitais. O Brasil tem uma dívida social imensa. Precisamos pensar em como utilizar o orçamento público. O suposto combate às drogas tem um custo orçamentário que recai sobre o bolso do contribuinte”, alerta Lemgruber.

Para Julita, pior do que a má aplicação do recurso público é o custo social da criminalização das drogas. “O Brasil tem uma taxa de letalidade altíssima. A Grande maioria morta é de pobres, negros e moradores de favelas. Esse é o custo humano, custo da dor imposta às famílias e às mães”, lamenta.

Dados

Ao presidente do Senado, as entidades levaram números e a preocupação com a falta de atendimento na rede de saúde pública, o estigma sobre os usuários, o superencarceramento por delitos relacionados a drogas e o aumento do potencial discriminatório nas abordagens policiais contra a população negra e periférica.

Na conversa Rodrigo Pacheco reafirmou o compromisso com pautas com o combate ao racismo, contra a redução da maioridade penal, o armamento da população, o populismo penal, o encarceramento da população negra, especialmente em abordagens que envolvem o sistema socioeducativo para crianças e adolescentes.

Quem participou?

Participaram da agenda representantes de entidades como Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), Conectas Direitos Humanos, Escola Livre de Redução de Danos, Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Iniciativa Negra, Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim), Articulação Nacional de Marchas da Maconha, Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme), Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD), Plataforma Justa, Rede de Justiça Criminal, Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.

Entre as 19 pessoas presentes, contamos com a participação de seis organizações integrantes do Conselho Nacional de Política de Drogas (Conad) vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. Atualmente o plenário do Conselho aguarda a convocação da reunião extraordinária pelo presidente do órgão e Ministro da Justiça Ricardo Lewandovsky para tratar sobre o tema.

Campanha #Usuário não é Criminoso

Todas as informações sobre a mobilização nacional, a nota pública assinada, os próximos passos da tramitação da PEC 45/2023 no Congresso Nacional, e a agenda de ações das entidades poderão ser acompanhadas nos sites e redes sociais das organizações envolvidas.

Com informações da  Agência Lema

Leandro Matulja / Leticia Zioni / Guilherme Maia

Published On: Abril 4th, 2024 / Categories: Uncategorized /